quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Gimico, ponta driblador e artilheiro


Matéria de Edivaldo pereira Biguá e Tânia Biguá, página "Onde Anda Você?", do Jornal O Estado do Maranhão.

Pessoas que nascem com o dom de jogar futebol, Deus colocou de sobra no Maranhão. E depois concedeu a muitos o privilégio de vê-las jogar. Edemir Azevedo Gonçalves, o Gimico, é uma das estrelas que brilharam nos nossos campos de futebol. Muitos torcedores se admiravam de ver como o atleta tirava proveito de seus 1m60 de altura. Um atacante que chegava ao gol com extrema facilidade. Se tornou o grande terror dos laterais que o marcaram, pela incrível habilidade na condução da bola. Quando perguntavam em quem ele se espelhava, tinha orgulho em dizer, batendo no peito, que era nele mesmo.

A arte de jogar veio de berço. Dos quatro homens da família, Gimico, Heraldo, Edmar e César, todos sabiam jogar. Apenas Gimico e Heraldo seguiram carreira. Jogaram no Ferroviário, Moto, Sampaio, São José e outros times de fora do Estado (Gimico tem ainda quatro irmãs – Lourdenize, as gêmeas Carmem e Carmelita e Maria de Fátima).

O aprimoramento do dom de jogar de Gimico se deu nas peladas do Bairro do Apeadouro, onde ele e os irmãos nasceram. Mas foram as peladas em campo grande (oficial) – com a turma do bairro no 24º Batalhão de Caçadores – as mais marcantes, que serviram de trampolim para o ingresso na carreira profissional. Eram antecedidos de treinos durante a semana e jogos aos sábados e domingos em bairros diferentes: Maracanã, Maioba, Mata e outros próximos ao Apeadouro.

 Heraldo e Gimico do Ferrim

Já nessa época ele mostrou qualidades técnicas e muita agilidade. Porção opção própria, escolheu jogar na ponta-direita. Se sentia bem quando partia pra cima do marcador e conseguir dar dribles desconcertantes, chegando fácil ao gol. “Eu acreditava muito em mim, apesar de ser baixinho. Não tinha medo de tamanho e nem de cara feia. Partia para o drible e saia em velocidade. Quando recebia um bom lançamento, ganhava os ‘back’ na corrida e ia para o abraço”, relembra ele ainda feliz com essa habilidade, que foi sua maior marca.

Ao completar dezessete anos de idade, Gimico calçou pela primeira vez um par de chuteiras – no Santos do Bairro de Fátima. Lá, fez fama ao lado de amigos, como Louro, Chicão, Corisco, Pelado, Caburé, Neco, Cambota, Zé Bulina e o finado Bita. “Era um timezinho danado de bom, daqueles que fava gosto jogar. Passávamos a semana inteira esperando chegar o domingo para darmos show nos campos do Bairro de Fátima e de toda Ilha de São Luis. Uma época inesquecível”.

No Santos, ele foi aperfeiçoando naturalmente seu jeito de jogar. Se preparava fisicamente durante a semana, treinando muito controle de bola, cruzamentos e batidas em gol. Na prática, tudo dava certo. Por onde passou, foi artilheiro. Não tinha um chute forte, mas sabia colocar a bola no contrapé do goleiro. “Eu não usava a força e sim a inteligência”.

Heraldo já era nessa época cabeça de área profissional do Sampaio Corrêa. Sempre que podia, Gimico ia ao Estádio Santa Izabel acompanhar os jogos do irmão. Até então ele não pensava em seguir a mesma carreira.

No início de 1967, Godô, um amigo da família e funcionário da Rede Ferroviária Federal, resolveu levar Gimico para fazer uns testes no aspirante do Ferroviário Esporte Clube. Iniciava-se aí uma carreira curta, porém vitoriosa de um dos mais importantes pontas da história do futebol maranhense. Nos dois anos que passou no aspirante do Ferrim (1967/68), Gimico se destacou como artilheiro dos campeonatos estaduais. “Aprendi muito com o mestre Justino, que era técnico do aspirante do Ferroviário na época. Desenvolvi a minha autoestima e trabalhei muito o controle de bola, cruzamentos e chutes a gol. Eu e toda geração de ‘boleiros’ daquele tempo tínhamos que ter habilidade para conduzir a abola nos gramados do Santa Izabel e Nhozinho Santos, porque eles eram de ‘capim de burro’ e não de grama especializada. Tinha muitos buracos entre uma touceira e outra”.

A promoção ao quadro de profissionais do Ferroviário aconteceu em 1969. Entrou em substituição ao Neco, que estava machucado. A estreia foi contra o Maranhão Atlético Clube. Um dia que Gimico não esquece. “Eu cheguei cedo no estádio para jogar no aspirante que iria fazer a preliminar. Seu Justino me aberturou e disse que eu não ia a campo naquela tarde porque me viram beber pela manhã. Eu não entendi nada, porque não havia bebido, muito pelo contrário, estava em casa concentrado para o jogo. Depois do susto, seu Justino me disse que não iria jogar no aspirante e sim no profissional. Meu Deus! Quase cai de costa. Tremi dos pés à cabeça. Ainda bem que recebi o apoio do Esquerdinha, Nélio, Cândido e do meu irmão Heraldo. Fui para o jogo e acabei marcando um gol. Vencemos por 2x1. Foi o máximo pra mim”. Nesse ano, Gimico foi o artilheiro e revelação da competição. Em 1971, uma grande experiência foi vivida pelo craque. Jogou contra o irmão Heraldo, que trocou o Ferroviário pelo Sampaio. De um lado estava o lateral-esquerdo boliviano. Do outro, o ponta-direita do Ferrim. Páreo duro, muitas das vezes vencida por Heraldo. “Quando eu pegava na bola, Heraldo e dizia para não ir pra cima dele porque caso contrário ele seria obrigado a me acertar. Era muito difícil jogar contra ele”.

Não faltava arrumações, descoberta com a chegada de Heraldo e Célio Rodrigues, ex-lateral direito do Sampaio Corrêa, no bar de Gimico, que fica no Apeadouro. Heraldo confessa que no diálogo entre os dois, em campo ele lembra que o bicho do tricolor era maior que o da RFFSA. “No Sampaio Corrêa eu ganhava 100 cruzeiros de gratificação por vitória e Gimico ganhava 50 no Ferroviário. A minha gratificação dava para dar 50 para a nossa mãe e o restante era para a gente comprar roupas e tomar umas cervejinhas. Por isso eu dizia pra Gimico: não complica”, conta rindo Heraldo.

Ainda em 1971 Gimico se transferiu para o Moto e lá encontrou o irmão Heraldo, que havia deixado o Sampaio Corrêa. Como na adolescência, iriam jogar juntos novamente. A dupla brilhou. O Moto foi o campeão invicto do Torneio Maranhão-Pará, disputado em Belém. Gimico, um apelido que virou nome ninguém sabe porque, ganhou um apelido nessa época, “Satanás”. “Em 71, no Torneio PAxMA, lá em Belém, contra o Paysandu, o Moto perdia por 3x1 e Gimico estava no banco. Ele virou-se para o técnico Marçal e pedi para entrar porque sentia que dava para virar o jogo. Marçal não deu ouvidos. Ele insistiu várias vezes para o técnico deixa-lo entrar, até que conseguiu. Quando estava em campo, infernizou a defesa adversária e ajudou o time a virar o placar pra 4x3. Passaram a chama-lo então de Satanás”.

No início da temporada de 72, Gimico foi dispensado do Moto pelo técnico Sousa Arantes. “Ele disse que baixinho não jogava no time dele. Fui disputar o Troneio da Marinha pelo São José. No dia do jogo contra o Moto, eu infernizei a vida da defesa motense e acabei fazendo o gol da vitória e do título do São José. Pronto, lavei a alma!”.

Dai pra frente Gimico, incentivado pela família, foi abandonando o futebol. Chegou a participar de vários amistosos pelo Sampaio Corrêa em 1974 e se livrou do acidente ocorrido com o ônibus que levava o Tricolor para um amistoso em Imperatriz, que vitimou o zagueiro Paulo Espanha. “Eu havia me contundido num treino e fiquei fora dessa viagem. Dou graças a Deus até hoje por isso”. Em 1975, atendendo a um pedido da mãe, Doa Maria Azevedo, e do irmão Edmar, engenheiro civil, Gimico foi morar em Pelotas/RS. Lá, ainda treinou no E.C. Brasil. “Passaram mais de um mês querendo que eu assinasse o contrato, mas meu irmão e minha mãe não permitiram. Assim, encerrei minha carreira como profissional da bola”. Em Pelotas, Gimico aprendeu com o irmão as técnicas de trabalho com máquinas eletrônicas e se tornou um Topógrafo Nivelador. Rodou várias cidades do eixo Sul/Sudeste do país, até que retornou a São Luís por volta de 1982.

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