domingo, 30 de março de 2014

Marabelgas: quem ganha e quem perde com as exportações

Matéria interessante publicada no jornal O Imparcial, de 01 de Junho de 1993, sobre a exportação de jogadores maranhenses para a Bélgica, os chamados "Marabelgas", como ficaram conhecidos pela imprensa maranhense na época.


Qual a ligação entre a Bélgica, um país da Europa Ocidental desenvolvido, com três línguas oficiais (francês, alemão e o flamengo), índice zero de analfabetismo e o Maranhão, um estado nordestino, de um país subdesenvolvido e com quase 50% da população analfabeta? Aos olhos do cidadão comum, a resposta seria o óbvio: nada! Mas quem acompanha o futebol maranhense, consegue enxergar alguma relação que já dura oito anos e é uma grande polêmica entre clubes, cartolas, empresários e jogadores, os principais envolvidos no negócio: são os Marabelgas.

Este foi o apelido que a imprensa colocou na transferência dos jogadores de clubes maranhenses para o futebol belga que começou em 1986, com a ida do garoto Oliveira, de 17 anos, até então um desconhecido valor do Tupan. O negócio foi feito então através do dirigente motense, o médico Cassas de Lima, que ao participar de um congresso sobre artroscopia na Bélgica, conheceu o empresário Guisepp Rubilota, a quem indicou o jogador. O atacante conseguiu a adaptação, ganhou “alguns dólares”, naturalizou-se belga e passou a ser chamado de Oliverrá. É o início de uma intrincada história do futebol maranhense.

O campeonato maranhense que nesta época lotava os estádios, começou a receber a visita de empresários interessados em contratar novos craques e as transferências passaram a fazer parte do dia-a-dia dos jogadores. Mas se por um lado abriu-se um mercado internacional, iniciou-se também uma grande polêmica, já que muitos atletas foram “pescados” nos campos de pelada dos bairros e principalmente das divisões inferiores dos grandes clubes como o Moto Club e o Sampaio Corrêa.

“Não vejo nenhum benefício para o futebol do Maranhão com essas transferências para a Bélgica porque esses jogadores estão sendo negociados por empresários e atravessadores e por isso quem menos ganha são os clubes”, protesta o Presidente do Sampaio Corrêa, o Deputado Estadual Pedro Vasconcelos. Seu colega de parlamento e Presidente do maior rival, o Moto Club, Sebastião Murad, faz coro: “empresários atravessadores e inescrupulosos”, completa. E a gritaria não para por ai. “Esse tal de Rubilota é tão enrolão e fez tanta mutretagem no futebol belga que hoje está proibido de entrar no país sob pena de ser preso”, disse Pedro Vasconcelos.

O “x” do problema está na negociação que nunca é feita diretamente com os clubes. A mecânica sempre perseguem obscuros com a chegada do empresário que conhece um dirigente – geralmente alguém ligado ao departamento de futebol e nunca o presidente do clube – e esse indica o jogador que pode ser transformado em “Marabelga”. O atleta é contratado e um mundo de promessas – dólares, casa, carro – são feitos pelo empresário. A resposta é fácil de ser obtida. Quem não quer tocar os parcos salários do futebol maranhense pelos dólares e uma super infraestrutura e condições de trabalho? Mas é justamente nesta hora que os lados que ninguém vê entra em cena, amparado por uma legislação da FIFA que apoia o “roubo” – como enfatiza o Presidente do Moto Club – de jogadores. Isso porque o atleta é amador (das divisões inferiores, juvenil e júnior) não possuem contrato que o prendem ao clube em que treinam e portanto saem do país, muitas das vezes sem nem os dirigentes saberem tal jogador já é um “Marabelga”.

O pioneiro na exportação de jogadores para a Bélgica, o dr. Cassas de Lima diz que acha ótimo essas transferências, desde que obedeçam aos trâmites legais. Responsável pelo embarque de mais de 15 atletas, ele diz que nunca ganhou um dólar nestas transações e sempre seu trabalho foi o de apenas indicar aos empresários na contratação. “Esse problema da transferência de jogadores para a Bélgica acontece porque aqui tem um grupo que compra jogador e fica roubando os clubes. Eu não! Quando indico um jogador, está indicado. Os negócios que são feitos todo mundo sabe, a imprensa toda divulga, os clubes recebem e pronto. Nunca ganhei um dólar nestas transações”, jura o dr. Cassas.

A Federação Maranhense de Desportos (FMD) diz que nada tem a ver com as transações e que apenas se limita a dar o okay quando os clubes a procuram para movimentar a documentação. “Acho ótimo a ida dos jogadores maranhenses para a Bélgica, desde que a transferência seja legal e o clube do Maranhão seja indenizado pelo clube que esteve com o atleta”, declarou Alberto Ferreira, Presidente da FMD, que admite que a Federação não tem controle sobre a saída dos jogadores amadores que vão embora a mercê dos clubes e da própria entidade.

Novas Exportações – Mais dois jogadores do futebol do Maranhão estão sendo transferidos para a Bélgica. Toninho, zagueiro do Sampaio Corrêa, viajou no início da semana para São Paulo, de onde, em companhia de um empresário cujo nome foi mantido em sigilo pelo clube, segue para aquele país europeu, onde fará teste em um clube da segunda divisão. Se for aprovado, fica e o Sampaio fixa o preço do seu passe. Com o dinheiro, a diretoria espera contratar outros bons jogadores e resolver parte dos compromissos financeiros, que não são pouco. Outro que já está de passaporte na mão é o centroavante Juca, do Maranhão Atlético Clube. Ele viaja exatamente quando o clube mais precisa de sua presença, haja vista que, decide, domingo, o primeiro turno contra o Moto. Seu passe está fixado em U$$ 10 mil dólares (Cr$ 500 milhões) aproximadamente.
 
 Zagueiro Toninho

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