Texto extraído do livro "Salve, Salve, meu Bode Gregório: a História do Maranhão Atlético Clube"
Em Dezembro de 1948, o Fluminense carioca esteve em São Luís para um jogo amistoso no Santa Izabel, contra o Moto Club. Um garoto, com apenas nove anos de idade, resolveu assistir aquela partida: entrou pela cerca do Santa Izabel e viu o Papão do Norte ser derrotado por 2 a 0. O garoto, porém, ficou fascinado pelo ala do time carioca, que já se destacava por cobrar o lateral dentro da área, algo impensável naquele momento em São Luís. O jovem levou essa idéia para as peladas no Largo da Madre Deus, onde, naquele tempo, usavam-se bolas de seringa e de pano. O garoto era o franzino Sebastião Silva, o Baezinho.
De origem humilde no Bairro da Madre Deus (os seus pais eram pescadores e muito pobres), o jovem, que atendia pelo apelido de Tione, passou a infância e boa parte da adolescência batendo bola juntos aos garotos da sua idade (jogava no chamado time de touca). Em uma dessas brincadeiras, completamente entusiasmado com o seu desempenho, gritava para os atacantes que tinham a bola tirada por ele: “Aqui é Baé e ninguém vai passar por mim”, referindo-se ao então zagueiro do Moto Club e porteiro da Fábrica Santa Isabel e que encantava a torcida com as suas saídas perfeitas de bola. Baé deu lugar então a Tione e o garoto foi fazer testes no Flamengo do Monte Castelo, até chegar à Seleção Estadual de Amadores. Logo na primeira partida, ele enfrentou o Moto Club, em um amistoso no Santa Isabel. O jogo seria transmitido pelo rádio. Jafé, quando foi pegar a escalação da Seleção, não teve dúvidas: chamou o franzino cabeça-de-área de Baezinho. Esse encontro acabou empatado em 2 a 2 e o garoto Baezinho foi um dos destaques. O treinador uruguaio Luis Comitante o olhou e pediu a sua contratação por César Aboud junto ao Flamengo. O seu primeiro contrato com o Papão foi assinado na condição de não-amador.
O craque começou a sua carreira no Moto em 1957, aos 18 anos, como centro-médio (atual volante). Comitante, porém, achava-o muito baixo para a posição e o remanejou para a lateral-direita. No começo da sua carreira, Baezinho recebia uma ajuda de custo do rubro-negro, muito importante por completar o ordenado em casa. O jogador ainda não trabalhava e completava os estudos no Colégio Sotero dos Reis. Somente em 1960 foi que ele conciliava a carreira de atleta com os trabalhos na fábrica, como carregador do estoque de algodão. Trabalhava no período da manhã e da tarde, treinando após o final do expediente. Foi bicampeão em 1959 e 1960.
Hoje se fala nesse tipo de lateral, que defende e ataca, mas Baezinho já fazia isso no Moto Club (e com total maestria). Com a sua mudança por Luis Comitante para a ponta-direita, o craque rubro-negro passou a voltar já fazendo a cobertura pelo meio: quando chegava no campo do adversário, cruzava a bola para o outro lado do campo e voltava para apoiar - caso perdesse a bola, ficava difícil fazer a cobertura, pois o adversário poderia lançar a bola nas suas costas. Outra grande característica do jogador era o famoso arremesso lateral que ele colocava na pequena área e, na maioria das vezes, na cabeça dos centroavantes. Muitos gols de Hamilton e Casquinha, por exemplo, nasceram dessas bolas lançadas no tiro de lateral por Baezinho. Após o horário do treino, ele passava a ensaiar as cobranças de lateral com bolas de medicinibol. Quando ia para os jogos, a bola se tornava leve: Baezinho dava uns três a quatro passos para trás e arremessava a bola para a área.
Em 1968 ele fraturou o braço e jogou pouco pelo Papão. Após rescindir com o clube, foi levado, a convite do agora treinador Omena, ao Maranhão, em 1969. Atuando pelo Bode Gregório, Baezinho venceu o seu ex-clube. “Dr. César ficou zangado por não saber que haviam me transferido. Ele dizia que eu era patrimônio do Moto e que o haviam traído”, relembra o jogador, que foi campeão naquele ano pelo Glorioso com a seguinte formação: Da Silva; Baezinho, Carlos, Sansão e Elias; Yomar, Toca e Almir; Euzébio, Jacinto e Dário. No ano seguinte, o bicampeonato, com o MAC reforçado com o goleiro Brito e o centroavante matador Hamilton. Pela equipe do Parque Valério Monteiro, Baezinho foi capitão e titular absoluto.
Baezinho ainda teve uma boa passagem pela Seleção Maranhense, juntamente com autênticos craques, como Laxinha, Hamilton, Garrinchinha, Nabor, Ribeiro, Esmagado e outros. Seus dois maiores orgulhos são ter defendido os clubes por onde passou com muito profissionalismo e, apesar de jogar na defesa, nunca ter sido expulso de campo. Por nunca ter recebido um único cartão vermelho em toda a sua vida (nem como jogador profissional ou como treinador das categorias de base e das escolinhas das quais dirige), o craque já deveria ter sido condecorado com o prêmio Belfort Duarte, título dado pela CBF aos atletas profissionais que nunca receberam um único cartão vermelho. Até hoje no Maranhão existem apenas três atletas que deveriam receber esse prêmio: Negão, Baezinho e Walber Penha.
A carreira do disciplinado atleta foi acabando na década de 1970. Nos primeiro anos ainda chegou a jogar no São José e Vitória do Mar. Esteve no Ferroviário em 1978, mas por pouco tempo. Voltou ao Moto para tomar de conta das categorias de base, a pedido do médico Ibrahim Assub e do radialista Magno Figueiredo. Foram mais de oito títulos nas categorias juvenil e júnior, além de ter revelado craques como Zé Filho Branco e Geraldo (jogaram no futebol da Bélgica), Clayton (naturalizado, jogou a Copa de 1998 pela Seleção da Tunísia), Chita, Zé Filho, dentre outros. Nunca teve uma contusão séria e resolveu parar por conta da idade - ainda hoje Baezinho joga futebol (na lateral-direita, diga-se de passagem) e se cuida bastante, apesar dos seus mais de 70 anos de idade. Pelo tempo no futebol, aprendeu a ser treinador de futebol e sabe dar massagem (quando estava prestes a encerrar profissionalmente no futebol, Baezinho iniciou um curso de enfermagem). Em 2002 foi condecorado com a medalha do Mérito Timbira, pelo Governador do Estado. Por uma carreira cheia de títulos, o jogador Lamenta que os dirigentes não lhe fizeram nem metade do que ele fez aos clubes que eles dirigiram. Isso pouco importa. Baezinho venceu na vida pelo esporte e o seu exemplo de profissionalismo ficará para sempre como modelo a ser seguido pelas futuras gerações.
domingo, 1 de dezembro de 2024
Baezinho, um lateral à frente do seu tempo
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário