terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Caio, um Campeão Mundial Interclubes que vestiu a camisa do Papão do Norte

Deixo aqui um post especial sobre a carreira do ex-atleta Caio, ponta que fez fama no Moto Club e Grêmio (RS). O texto abaixo foi extraído e adaptado do livro "Memória Rubro-Negra: de Moto Club a Eterno Papão do Norte", onde o próprio Caio, gentilmente, cedeu um longa entrevista para a conclusão de um capítulo especial sobre a sua vida e carreira. Deixo também fotos e um vídeo do programa Esporte 10, da TV Mirante

Matéria sobre o ex-jogador Caio, no programa Esporte 10 (TV Mirante)

As histórias que Caio contra do futebol são ricas como sua carreira. Depois de ser dispensado no inexpressivo Madureira (RJ) e conhecer os louros da fama no Sul do país, ele desembarcou em São Luis, para traçar seu caminho de títulos e vitórias. O Moto Club foi o ponto de partida. Para chegar à Portuguesa de Desportos e sagrar-se Campeão Mundial pelo Grêmio (RS), em 1983, foi num passo de mágica. Hoje, Luis Carlos Tavares Franco, o famoso Caio Turista, convive com um mundo completamente alheio à profissão que desempenhou com arte e maestria. Durante muito tempo foi gerente de vendas de uma Fábrica de Pré-moldados e Derivados, no Bairro do Anil, em sociedade com Paulo Figueiredo, técnico em engenharia. A falta de experiência de ambos, contudo, fez com que o empreendimento durasse pouco tempo.  Para ele, ser ídolo sem torcida é indiferente, importante é que o futebol lhe reservou momentos inesquecíveis. Como é que um jogador em plena forma, campeão do mundo, pretendido por grandes clubes do país, resolve parar de jogar? Caio assume que não soube administrar o muito dinheiro que ganhou e a precipitação de parar. Caio é carioca de Madureira e casado com a maranhense da cidade de Bacabal, Zelda dos Santos Carvalho Franco, e pai de Rafaela, 31 anos, e Caio Rafael, de 27 anos.

Nascido a 16 de Março de 1955, Caio foi criado em Madureira, um dos bairros de maior importância no comércio do Rio de Janeiro. O garoto teve uma infância muito humilde, onde o seu pai, Valter Franco, era fotógrafo, a família de Caio sobrevivia à base de muita dificuldade (filho de uma família com mais quatro irmão, Caio foi o único a despontar nos gramados). Ainda garoto, Caio já atuava pelo infantil do Brasil Novo, clube do próprio Bairro do Madureira e do qual o seu pai era sócio. Durante uma partida amistosa entre o Botafogo e o Brasil Novo, Caio arrebentou e despertou a atenção de Joca e Joel, treinadores do dente de Leite do Fogão, que imediatamente o levaram para treinar entre os seus atletas dessa categoria. Por influência do seu pai, botafoguense, Caio passou a frequentar o chamado dente de leite do alvinegro. Para treinar, pegava o trem de Madureira até a Central do Brasil, indo em seguida para o campo do Botafogo. Ficou ali dos 11 aos 17 anos, onde foi subindo de categoria (dente de leite, juvenil e os profissionais). Conciliava os treinos com os estudos, em um dos melhores colégios da capital carioca (Colégio Piedade e Faculdade Gama Filho).

Iniciou a sua carreira profissional no Botafogo como ponta-direita. Estreou no dia 23 de Maio de 1975, na derrota para o América em pleno Estádio do Maracanã, pelo Campeonato Carioca daquele ano. O craque jogou apenas essa partida - como um Botafogo recheado de craques como Zequinha, Gérson, Afonsinho, evidente que o jovem Caio não encontrou espaço e acabou emprestado ao Madureira, por indicação de Zequinha. Por obra do destino, estreou justamente contra o seu ex-clube, o Botafogo, na derrota por 3 a 0 para o alvinegro carioca. Em um Campeonato Carioca onde os grandes estavam respaldados por verdadeiras feras (Flamengo com Adílio, Andrade, Zico; Vasco com Roberto Dinamite), o Madureira apenas figurou dentre mais um na competição. Caio, porém, foi um dos grandes destaques da equipe. O ponta-direita passou dois anos na equipe da Rua Conselheiro Galvão, que também dá nome ao estádio do Madureira, antes de transferir-se, em 1977, aos 22 anos, ao Moto Club por intermédio do Coronel Santana, que havia sido treinador do Maranhão Atlético Clube e que havia conhecido Caio durante um jogo no Rio de Janeiro.

Caio já deixou a capital carioca com o contrato assinado, após ganhar passe livre no clube do interior carioca. Chegou a São Luis em uma quarta feira à tarde, dia 18 de Maio, e à noite já estava nas tribunas do Nhozinho Santos, para acompanhar a vitória do seu novo clube diante do Tupan por 3 a 0. A sua estreia seria dali uma semana, diante do Sampaio Corrêa na grande decisão do Terceiro Turno. Apesar da derrota para o seu grande rival, Caio foi um guerreiro dentro de campo, acabando com o lateral Ferreira, da Bolívia Querida. Pelas suas grandes atuações, logo o craque acabou caindo nas graças da torcida motense. Naquele ano o Papão tinha um timaço, que jogava no 4-3-3 e dirigido pelo gênio Marçal, que começou a lança-lo como centroavante (Caio veio ao Papão como ponta-direita): Marão; Célio Rodrigues, Vivo, Irineu e Breno; Tião, Toninho Abaeté (Beato) e Edmilson Leite; Caio, Paulo César e Alberto. Caio foi Campeão Maranhense e disputou o Campeonato Brasileiro daquele ano. Craque, sempre levava a torcida ao delírio quando ia à linha de fundo, geralmente pela lateral, no lado de fora da linha divisória do gramado. Uma passagem, segundo o próprio jogador, ficou marcada: Ivanildo e Rosclin eram dois zagueiros do Sampaio Corrêa e adeptos do melhor estilo “a bola pode até passar, mas o zagueiro...”. Durante um Superclássico, Caio havia pedido ao bandeirinha que não o atrapalhasse quando da sua ida à linha de fundo. Edmilson Leite lançou a bola e Ivanildo, afoito, passou batido após um toque sutil de Caio. O zagueiro boliviano somente foi parar com as pernas abertas abraçado à bandeirinha de escanteio. Caio ainda ironizou, parando propositalmente a jogada e estendendo a mão a Ivanildo, como quem dizia: “apende a jogar futebol!”, levando a torcida à loucura. Gênio.

A fama de Turista nasceu por conta do Jornalista Herbert Fontenelle. Na época, especulava-se que, por falta de acerto no contrato, Caio ia embora para o Rio de Janeiro; após uma conversa com o Dr. Cassas de Lima, dirigente do Papão, os problemas se resolviam e Caio retornava aos treinos. Na verdade, segundo o próprio jogador, o que muita gente não sabia era que o atleta estava noivo e ela ainda residia no Rio de Janeiro. Na época, Caio morava em uma pensão na Rua do Sol, de propriedade da Dona Pampulha – outros residiam na sede do Tirirical. O Presidente Pereira dos Santos, do alto da sua autoridade de Major da Polícia, prometeu mandar prendê-lo após uma nova sumida. Nunca mais Caio desapareceu, enterrando de vez a mania de viajar sem um aviso prévio. A fama de turista, porém, permanece até hoje...

No inicio de 1978, após um jogo amistoso entre Moto Club e Paysandu, onde o próprio Caio foi o autor de um golaço histórico, pegando de primeira a bola cruzada por Breno, ele e Paulo César (destaques da partidas), foram por empréstimo ao próprio Paysandu, para as disputas da Taça de Ouro no primeiro semestre daquele ano. Após a eliminação precoce do bicolor na competição, ambos retornaram ao Papão para as disputas do Campeonato Maranhense. E chegaram a tempo de ver o Moto chegar ao vice-campeonato diante do seu maior rival, formado com o tri Prado, Cabecinha e Bimbinha. Em sua primeira passagem pelo rubro-negro maranhense, já com o seu passe valorizado, o atleta permaneceu no Papão até o dia 27 de Junho de 1979, após três gols na goleada sobre o Vitória do Mar por 8 a 0 (Marçal o havia colocado como meia-esquerda). A essa altura, Caio já vinha sendo observado por João Avelino, olheiro e auxiliar técnico de Oswaldo Brandão, da Portuguesa de Desportos. Avelino estava nas arquibancadas durante a goleada contra o Vitória do Mar e não teve dúvidas em levar o ponta-esquerda para o Canindé. Quando a Portuguesa o procurou, o atleta já havia conseguido o passe livre e renovado por mais um ano com o Moto. Como gratidão em sua primeira passagem pelo rubro-negro, Caio deu ao Moto o direito de negociá-lo para um grande centro como o futebol paulista, mediante é claro os 15% referentes à transação para a Lusa. Chegou no andamento do Campeonato Paulista daquele ano, quando Oswaldo Brandão, treinador da Lusa, foi mandado embora e João Avelino assumiu o cargo. O clube sofreu uma grande reformulação no elenco, chegando alguns bons jovens atletas para o plantel, como Rui Lima, Quaresma, Cacá, Gerson Sodré e o próprio Caio, que terminou o Campeonato Paulista daquele ano como vice-artilheiro (19 gols), um a menos que Rubem Feijão, do Santos.

 Comemoração da torcida e dos jogadores pelas ruas, do aeroporto até o Estádio Olímpico

 Comemoração da torcida e dos jogadores pelas ruas, do aeroporto até o Estádio Olímpico

 Caio, terceiro agachado, no Grêmio

 Jogadores desfilando com a taça do Mundial, em 1983

 Comemoração da torcida gremista na volta do time ao Brasil, após o Mundial de Clubes, em 1983

 Grêmio campeão da Taça Liberdadores da América de 1983

 Caio comemorando o segundo gol na final da Libertadores de 1983



Caio com a camisa do Grêmio

Grêmio Campeão da Libertadores 1983

Caio ficou na Lusa até Março de 1983, sem ao menos conseguir deixar a equipe do Canindé entre os quatro primeiros colocados durante a sua passagem pelo clube lusitano. As suas grandes atuações e o seu refinado trato com a bola, porém, foram o suficiente para despertar o interesse do Grêmio, que o levou após uma breve negociação. Quando retornou de férias em São Luis, em Janeiro de 1983, Caio não teve o seu contrato renovado com a Lusa, embora ele tenha sido ídolo do clube e um dos grandes nomes do elenco da Portuguesa. O jogador, então, passou a treinar separadamente do grupo, até ser emprestado à equipe de Porto Alegre por intermédio de Wilton, preparador físico que, na época, trabalhava no São Paulo Futebol Clube e que trabalhava agora no clube porto-alegrense. O tricolor gaúcho precisava com urgência de um centroavante para as disputas da Taça Libertadores. Contrataram César, que atuava no futebol português, mas não estava rendendo em campo pela diferença do calendário entre o futebol nacional e o de Portugal. A diretoria, então, oficializou a vinda de Caio, que chegou por empréstimo de dez meses e na condição de reserva de César, um atacante de Portugal. Foi uma briga bonita. Na arrancada, Caio levou a melhor, pois estava com condicionamento físico adiantado. Vestiu a camisa do Tricolor gaúcho ao lado de nomes como o polêmico Renato, o habilidoso Mário Sérgio e o vigoroso e habilidoso Hugo de Leon, na época em sua melhor fase. O treinador era Valdir Espinosa. Caio foi a grande peça do Grêmio para as conquistas da Taça Libertadores e Mundial de Clubes de 1983 (foi dele, inclusive, um dos gols da grande decisão contra o Peñarol, pelo torneio sul-americano). Porém, a grande mágoa do ponta foi chegar a Tóquio na condição de reserva: o treinador Espinosa havia solicitado a contratação do centroavante Paulo César Caju, contrariando o ataque titular que vinha atuando até então na Libertadores e ajudado a equipe a chegar àquele Mundial. Caju não aguentou sequer o primeiro tempo e Caio foi logo lançado a campo, sendo ele, inclusive, o autor do passe do tento da vitória gremista sobre o Hamburgo, da Alemanha, por 2 a 1. Na chegada ao Brasil, a multidão tomou de conta do aeroporto. De lá até o Estádio Olímpico, em carro aberto, os jogadores foram empurrados pela massa, sorrindo, chorando e comemorando aquele inesquecível titulo. Era um momento de muita glória na carreira de Caio. Como prêmio pela conquista, a diretoria Tricolor pagou a cada atleta a quantia de U$ 6 mil. Apesar de todo luxo, alto salário no Sul e, na época, configurar dentre os vinte maiores goleadores da história do Grêmio (48 gols), resolveu deixar o Grêmio, em Dezembro de 1984, quando entrou em férias e abandonou os gramados por conta de uma grave contusão - uma distensão na virilha, durante um jogo pela  Libertadores de 1984. Após sucessivas idas e vindas, o jogador, já com 30 anos de idade e sem esperanças de uma recuperação total daquela lesão, resolveu parar. Na época, havia interesse de Santos e Palmeiras pelo seu empréstimo, mas o jogador comunicou o seu desligamento à diretoria gremista. O jogador ainda teve uma proposta para ser vendido ao Benfica de Portugal, mas o Grêmio, agora dono do seu passe, não aceitou – Caio saiu da Portuguesa para o Grêmio por empréstimo com o passe estipulado. Em suma, chegou a Porto Alegre com o passe lá embaixo. 

 Caio, o terceiro agachado, com a camisa do Moto Club

 Caio treinando no Papão


 Caio do Moto Club


Ao contrário do que muitos pensam, quando deixou o Grêmio, veio para o Maranhão para outro ramo – investiu em uma rede de Farmácias pela cidade. Em uma dessas peladas de fim de semana na praia, para espanto do agora aposentado jogador, ele não mais sentiu a tão incômoda contusão que o atrapalhara nos gramados. Tinha parado com o futebol, mas na época Mário Carneiro, Dr. Cassas de Lima, Ibrahim Assub e outros dirigentes rubro-negros pediram para o jogador atuar pelo Papão do Norte (como a equipe gaúcha era dona do passe do ponta, Caio não poderia mais atuar por nenhuma outra equipe). Mário foi até Porto Alegre e conseguiu a liberação do atleta para a sua segunda passagem pelo Papão, na época trinador por Zé Eduardo Branco e formado por um verdadeiro timaço: Moreira, Marinho, Ademir, Luís Cláudio e Zequinha; Ribas, João Neto e Raimundinho Lopes; Antônio Carlos, Caio e Zé Roberto. Caio estreou pelo Moto Club e assinou um contrato, no mínimo, inusitado: não viajaria e não concentraria. Isso provocou muitas críticas na época. Nesse ano, 1985, o Papão do Norte somente não foi campeão maranhense por conta do abalo pela perda do jogador Beto, que faleceu a campo durante um jogo contra o Tocantins. O ânimo do elenco não era mais o mesmo e o rubro-negro viu o Sampaio Corrêa chegar ao bicampeonato.

Caio ficou no Papão do Norte até 1989, ano do título maranhense e início do longo jejum de títulos pelo qual o rubro-negro passou ao longo de toda a década de 1990 (ainda teve uma breve passagem, em 1986, pela Tuna Luso, durante seis meses). Após a reapresentação do plantel, em Janeiro de 1990 foi realizada uma reunião com o grupo, insatisfeito com os salários atrasados. O Presidente Edmar Cutrim, em alto e bom som, tentou pôr fim àquele encontro: “se há alguma estrela no Moto Club aqui, essa estrela sou eu, que pago tudo aqui!”. Caio o contestou: “Estrela, só no céu e quando o tempo tá bom. Nunca vi o senhor colocar uma chuteira e entrar a campo. A sua obrigação é pagar o elenco. Se não quiser, largue o clube que sempre tem alguém que queria ser Presidente!”. Retirou-se da reunião, assinando em seguida, por revanchismo, com o Sampaio Corrêa, levado pelo então Presidente Pedro Vasconcelos. Pela Bolívia Querida, foi bicampeão (1990/91), abandonando em definitivo os gramados logo em seguida, já com 36 anos. Passou a trabalhar com escolinhas de futebol pelo Cohatrac e foi treinador e auxiliar pela Caxiense, Tupan, Imperatriz, Maranhão e no próprio Moto Club. A sua última experiência como treinador foi em 2000, pela equipe do Açailândia, onde encerrou a competição na honrosa nona colocação. Para quem usufruiu das maiores e melhores mordomias, em hotéis cinco estrelas de todo mundo e hoje convive no Bairro do Cohatrac, o jogador foi alvo de muito folclore, sobretudo pelo pós-futebol. Porém, o que fica é a bela contribuição de um jogador que fez fama no Brasil e deu à torcida do Moto Club o privilégio de vê-lo atuar com o manto rubro-negro.

3 comentários:

  1. Hugo, Pedro aqui..
    Caio foi meu primeiro treinador no futebol de campo.
    sabe muito e me ensinou muito!!!

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  2. Parabéns pela matéria. É de arrepiar. Caio jogava muito. Hoje está com problemas e está sendo ajudado e se ajudando aqui no sul. Ele merece nossa atenção, nosso carinho e respeito.

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  3. O Caio foi campeão carioca sub-20 em 1974 atuando pelo Madureira, sendo o autor de um dos gols na vitória de 2 a 0 contra o Fluminense na 3ª partida da melhor de 3 em São Januário. http://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=112518_04&pagfis=27257

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